Tatuagem no mundo corporativo

Tatuagem no mundo corporativo

Apesar da aceitação nas empresas, alguns estigmas ainda continuam. Entenda como chefes e corporações veem os tatuados hoje.


Desde quando o capitão James Cook registrou em seu diário de bordo a onomatopeia "tattow", som feito pela fina agulha de osso na pele, até os dias de hoje, a tatuagem ganhou muitos rótulos. A mística de que tatuagem é uma coisa ruim começa na Idade Média, quando a igreja Católica - sempre ela - baniu a prática por considerá-la demoníaca e que vandalizava o corpo, propriedade de Deus. Já na Inglaterra do século XIX, a tatuagem era uma forma de identificar criminosos, bem como acontecia com os judeus na Alemanha nazista. A questão é que o tempo passou e nós sabemos que judeus não são ladrões e que tatuagem não é um estigma de vida incorreta. É uma forma de arte. Ainda que nas prisões de hoje a tatuagem seja uma forma de identificar grupos de criminosos, fora delas a tatuagem é a demonstração de uma personalidade, de uma cultura ou de um estado de espírito. E identifca grupos, também. Há estilos para todos os gostos.

Umas das grandes discussões em torno das tattoos é a aceitação profissional do tatuado. Em um dos episódios do programa Polícia 24 Horas, da Rede Bandeirantes, um dos "enquadrados" disse que vendia drogas pois não conseguia arrumar emprego por causa de suas tatuagens. Ao mesmo tempo, este redator aqui já viu um gerente de banco com o pescoço todo tatuado. Minha vó diz que tatuagem é "coisa de malandro". Então, propõe-se a pergunta: afinal de contas, tatuagem define caráter no mundo corporativo? Segundo alguns especialistas em Recursos Humanos, a tatuagem hoje não é mais uma marca de rebeldia. No entanto, ainda há de se ter bom senso, pois, apesar do afrouxamento no estigma, alguns ambientes corporativos exigem mais "sobriedade" que outros.

O que se vê hoje é que o impacto que uma tatuagem causa em um ambiente de trabalho depende do setor, do cargo ou até mesmo do perfil do chefe. Segundo Rodrigo Costa, gerente de recrutamento da Jonhson & Johnson, "em geral, tatuagem não define caráter. A maioria das empresas hoje não se importa com uma tatuagem ou outra, desde que sejam discretas. Alguns ramos (como propaganda e música, para citar os exemplos mais óbvios) aceitam maior "abuso" e tatuagens mais aparentes, enquanto outros (como um escritório de advocacia) são mais rígidos". A tatuagem transformou-se em um indicativo de personalidade da mesma forma que maneira de falar e de se movimentar também o são, mas não é definitivo para rotular uma pessoa. Ou seja, independentemente de quantos rabiscos você tenha no corpo, o que vale é a sua capacidade de produzir. As empresas, apesar de serem mais receptivas com tatuados, ainda tentam manter uma certa linha em alguns departamentos. "As tatuagens visíveis é que geram polêmicas. Pequenas tatuagens, discretas e/ou partes do corpo que ficam cobertas no horário comercial passam despercebidas", diz Lubiana Prates, analista de Recursos Humanos de uma grande empresa.

Para que não haja confusão, podemos estabelecer algumas diretrizes em função de determinadas profissões. Se o seu futuro é dentro de uma indústria, como uma usina ou uma sala-forno, é preferível que suas tatuagens sejam mais escondidas (costas, peito, pernas) para que não cause choque ou distrações durante o trabalho. Departamentos onde profissionais entram em contato com diferentes tipos de pessoas, como escritórios de advocacia ou vendas, recomenda-se também que não haja tatuagens muito visíveis. A questão aqui, deve-se deixar bem claro, não é de preconceito. A questão é que esses departamentos são microssociedades que tem as suas próprias regras. Da mesma forma que em uma sociedade não se deve andar nu, dentro de uma microssociedade, como um escritório de advogados, tatuagens berrantes dissonam do status quo.

De acordo com Rodrigo Costa, o melhor termômetro para não causar nenhum transtorno em ambientes corporativos é o bom senso. Tatuagens ofensivas e preconceituosas, obviamente, não são bem vindas em lugar algum, mas, dentro de uma empresa, uma tatuagem funciona como uma vestimenta. Se não há exageros, não há problema. Nenhuma empresa tem uma política sobre o assunto, o que faz com que a decisão de ter ou contratar uma pessoa tatuada cabe tão somente ao tipo de chefe que está lá. Também não há registros de empresas que barraram funcionários por causa de suas tatuagens, nem pediram para que um candidato tirasse a roupa para mostrar o que por ventura tenha escondido.

A bem da verdade é que hoje a tatuagem se tornou mais regra do que exceção. É muito difícil ver uma pessoa que não tenha uma. É por esta mudança no comportamento da sociedade que as empresas acabam por ser mais condescendentes, pois as probabilidades de achar um funcionário que tenha boa índole, seja um bom profissional e não tenha um "rabisquinho" são pequenas. Sabemos que tatuagem não muda caráter, mas também não podem ser um estandarte em um profissional, dependendo da carreira que queira seguir. "Caso haja um lugar onde isso [ser tatuado] pode ser ruim, é importante pensar: será que é um lugar onde você gostaria de trabalhar? Às vezes, não ser aprovado é uma bênção disfarçada", completa Rodrigo.

Renata Campos, 25 anos, advogada

Sofri preconceito uma única vez, pois sou da área jurídica, onde a tatuagem é muito mal vista. Mesmo tendo uma tatuagem nas costas, onde qualquer blusa esconde, ouvi críticas e me aconselharam a não fazer mais e, se possível, removê-la, pois na carreira jurídica é um "impedimento". Porém, hoje, depois de quase 3 anos desse episódio, posso afirmar que o preconceito não estava na minha área de atuação e sim na cabeça dessas pessoas. Estou indo pra segunda tatuagem, e não tenho mais problemas com isso.


Fernanda Campello, 29 anos, hoteleira

Nunca sofri preconceito por causa das tatuagens, talvez porque elas não aparecem devido ao traje social que uso para trabalhar diariamente. A apresentação pessoal é muito importante no ramo em que atuo, com restrições até para cor de esmalte de unha, por exemplo. Acredito que sofreria preconceito ou até mesmo receberia advertências se mostrasse as tatuagens durante o expediente.

Ricardo Ferro, 38 anos, designer

Sou designer freelancer, portanto, não tenho um ambiente corporativo de trabalho. Tenho um home-office onde clientes me visitam ou outros onde eu mesmo visito. Por minha tatuagem não ficar tão à mostra assim (está na parte superior do braço esquerdo), nunca observei algo relativo a isso. No entanto, por lidar com uma porção artística em meu trabalho - e, frequentemente ter artistas como clientes - creio que não haveria qualquer situação constrangedora ou discriminatória nesse aspecto.




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